Escrever um jornal ou um diário tem um ponto: as emoções são reais, vivas e sem filtros, como este texto.
Estou há uns dias em casa devido à quarentena do Coronavírus. Foi durante esses dias que percebi os dias excepcionais que estamos a viver.
E lembrei-me que já passei por uma crise assim, a de 2008.
Era jovem, não sabia o que ia acontecer. Não trabalhava na altura, mas colhi os seus resultados. Lidei com um mercado de trabalho que não absorvia jovens recém-licenciados, fui a mais de 20 entrevistas em 2 anos, sem sucesso. Ficava contente quando trabalhava num estágio não remunerado e queria apenas começar de alguma forma.
O emprego para a vida, as carreiras pré-definidas e os salários altos tinham acabado. Era preciso começar a carreira de uma outra forma, com objetivos diferentes e outras precauções.
Hoje, parece que estamos a viver uma crise igual.
Estou em casa e não sei quando volto. Os planos de contigência das empresas podem mudar as minhas funções de hoje para amanhã (e com total razão para o fazerem e abraço isso). São estes desafios que me vão certamente fazer crescer uns bons anos e quando sairmos disto vamos olhar as coisas de maneira diferente.
Esse é mesmo a ansiedade de mim, uma Millennial: tudo isto vai ser diferente.
Não bastava o mercado de trabalho, os empregos para a vida, as carreiras, os ordenados, a compra da casa. Tudo vai voltar a mudar daqui a um par de meses. Já houve situações de emergência na Europa, como há 100 anos, com a influenza espanhola, as crises financeiras ou com a pandemia do HUV/SIDA. Contudo, na altura não havia blogs para partilhar ou chats para manter o contacto.
Vamos sair disto? Claro que sim. E como vamos sair? Com tempo, com esperança. E depois? Não faço a puta de ideia.
Dizem para nos mantermos ativos e eu ocupo a minha mente, mas sempre a pensar no dia de amanhã, o futuro, o que não sei ou não dou por certo.
Quando voltar tudo ao normal, a economia mundial terá perdido biliões de dólares. As empresas terão de reestruturar todos os seus planos para 2020 e talvez estejam receosas de voltar ao que tinham planeado. As feridas estarão abertas e as memórias frescas.
O tempo de crescimento capitalista exponencial vai ser seriamente colocado em causa.
Imagino uma mesa de diretores daqui a umas largas semanas: como fazemos com os recrutamentos? Fica tudo igual ou não precisamos de tanta gente? É que se há outra crise assim não temos capacidade.
E as progressões de carreira? E o pagamento de impostos? Como ficam as receitas? E as funções de cada um? Já pensaram no espaço de escritório caríssimo, mas não utilizado recentemente?
E os novos investimentos? Devemos procurar novas formas de rendimento para prevenir um estado de emergência ou devemo-nos focar no que somos realmente bons?
E as start-ups? Como ficam as rondas de financiamento? As ideias-piloto que precisam de rondas de investimento? E aquele negócios que vivem de publicidade ou de clientes a entrar pela loja?
E o meio ambiente? É desta que acabamos com o petróleo ou a carne de vaca ou que vamos passar a andar todos de carro elétrico? É agora que vamos investir na Inteligência Artificial e deixar as máquinas salvarem a economia?
Pois é a única coisa que posso adiantar do futuro: vamos repensar critérios.
Os ciclos económicos ensinavam-nos que há sempre recessões de poucos em poucos anos. Mais, a recessão de 2008 batia com a recessão de 1929, já que estes crashes são parecidos e estão separados por 80 anos. Ou seja, lá para 2090 preparem-se que vai haver merda de novo.
Assim, esses ciclos ensinaram-nos que depois de 2013/2015, estavamos prontos para crescer, para ter dinheiro, para investir, para consolidar a vida. E que talvez em 2020 as coisas acalmassem, que em 2022 houvesse um recuo na economia e que lá para 2025 a coisa voltava a crescer.
Chegar a 2020 deu-nos logo más percepções quando um “pequeno” vírus oriundo da China apareceu em dezembro de 2019 e três meses depois levou a OMS a declarar pandemia. E essa pandemia fez as pessoas fecharem-se em casa.
Sim, as pessoas todas digitais, que não largam o telemóvel, que já não se falam face-to-face recebem um vírus que lhes permite exactamente fazer isso. Mas mesmo assim, não estamos a gostar de ficar em casa, de não vermos os nossos. Calhar um vírus num paí que adora o mar, a praia e um espaço livre sempre que há um raio de sol é realmente tramado, para não dizer outra coisa.
E cá estamos fechados em casa. e Vamos superar os próximos dias. E depois disto tudo?
A transformação digital vai começar à séria? Ou afinal não aprendemos nada disto e vamos voltar à normalidade, já que vamos esquecer tudo num par de meses e uns quantos jogos de futebol no Estádio da Luz?
Quando isto tudo voltar ao normal como será o mundo? Vai mudar imenso? Vai mudar nada? Que lições os nossos governantes vão retirar desta experiência que vai certamente afetar o ano todo? Como vão as pessoas mudar os seus hábitos ou as suas reivindicações? Como vão as empresas adaptar os seus negócios para o digital ou para se protegerem de algo semelhante no futuro?
São muitas perguntas para zero respostas. É o problema de viver no futuro, em vez de no presente. Contudo, as melhores respostas aparecem com o tempo, por isso vamos deixá-lo “fazer acontecer”.