Esta reflexão sobre o culto da imagem nas redes sociais não é nova e muitas pessoas já a tiveram. Hoje deixo aqui um pouco o meu testemunho.
Considero-me uma pessoa minimamente digital. Tenho redes sociais, já tirei vários cursos sobre marketing digital e, como profissional da área da comunicação, estar presente online é importante para mim.
Contudo, começo a notar alguns efeitos que as redes sociais têm em mim e no mundo geral e paro para questionar se esses comportamentos contribuem alguma coisa para a minha felicidade.
No final do mês passado, tive uma breve reflexão sobre o poder das redes sociais no Shifter. Fazia a ligação das redes sociais com os poderes do Estado e terminava o texto assim:
No fundo, as redes sociais deixam-nos uma questão muito pertinente para a vida política e para a cidadania: será que estamos a viver demasiado virtualmente e esquecemo-nos de que o espaço público dos cidadão é físico e vivido nas nossas freguesias e escritórios? Será que estamos mesmos só a jogar Candy Crush ou estamos a mudar a política do mundo em que vivemos cada vez que colocamos um like?
Esta reflexão também passou para a minha pessoal, quando viajei para Madrid há umas semanas.
Como estava em viagem numa cidade nova, tirei muitas fotografias de lugares, pessoas, manifestações e claro selfies. Contudo, partilhei muito menos nas redes sociais, pois quando estou em viagem quero mesmo aproveitar o sítio, um reflexo do que pode ser aproveitar o presente.
Ainda assim, Madrid fez-me questionar sobre o culto da imagem nas redes sociais.
Comecei a pensar porque partilhamos tanto?
Para alguns, as redes sociais são trabalho, pois trabalham na área ou utilizam a plataforma para promover os seus produtos e serviços. Para os restantes que publicam conteúdo pode ser só uma forma de partilhar com os outros mais ou menos conhecidos as coisas boas que a vida tem (muitos de nós, eu inclusive, gosta muito de por-do-sol na praia).
Foi este último tópico que me «assustou» em Madrid. Enquanto passeava, não se viam só turistas na rua. Via muitas pessoas «em pose», claramente a tirar todo o tipo de fotos com o monumento. Como se monumento fosse importante! O importante era que houvesse uma prova que a pessoa estivesse em Madrid e que houvesse «fotos de modelo».
Eu sinceramente comecei a perguntar-me: as pessoas estão a divertir-se assim?
Queremos assim tanto tirar fotos para partilhar? E partilhar porquê? Sentimos assim tanta necessidade de aprovação dos outros? Será que se não partilharmos nada é porque não viajamos de todo?
Enquanto pensava sobre o assunto, li a notícia com o título «Auschwitz está a pedir às pessoas que parem de postar fotografias nos carris que levaram as vítimas do Holocausto ao seu último destino». Pensei logo que tínhamos chegado ao baixo mais baixo. Num dos sítios mais inóspitos do planeta, há quem ache importante documentar a sua visita nas redes sociais com uma fotografia a «brincar» nos carris de comboio que transportaram milhões de pessoas para o extermínio.
Partilhamos estas fotografias porquê? Qual é a mensagem que queremos passar?
Queremos que as pessoas vejam o que estamos a fazer? Porque queremos aprovação ou para mostrar que ficamos bem na fotografia? Será que fazíamos o mesmo num cemitério? Como é que funciona isso? Não entendo este culto da imagem nas redes sociais.
Mordo a língua com o que vou dizer, mas quero poder partilhar outras coisas. Não quero que a minha mensagem seja sobre o meu dia-a-dia, mas como viver os dias à minha maneira me ajuda a viver um bom presente. Quero que o mundo me veja não porque quero aprovação, mas porque quero ajudar as pessoas a comunicar mais, a pensar mais, a ter ideias.
Posso de vez em quando postar detalhes sobre a minha vida, mas não quero compactuar com este culto excessivo da imagem. Se não tiver nada para dizer, não digo. Posso ter uma fotografia bonita, mas não preciso de a partilhar. Pode ficar para mim, não preciso de mostrar aos outros.
Esta reflexão foi ainda mais real quando sai de Madrid e roubaram-me a carteira e o telemóvel.
Foi um evento deveras chato e ao acontecer num país estrangeiro, deixou-me num estado mais stressado. Como se me tivessem tirado a vida. Todos os documentos foram recuperados, mas tive alguns dias sem estar «em pleno». Nesses dias, nada mudou, apenas não estive 100% online e isso fez-me bem. Não liguei ao “culto da imagem nas redes sociais”. Não me importei de “não aparecer”.
A responsabilidade de as redes sociais serem boas ou más só depende de nós, que lhes damos uso. E por isso, espero que as redes sociais sejam lugares de partilha de sinceridade.
Não tem mal nenhum mostrar o lado bom da vida, desde que seja sincero.
E não para por os outros num esquema depressivo de comparação, porque se não estamos a viver assim, não estamos a viver.
As redes sociais influenciam muito a nossa vida, mas não nos podemos esquecer que são uma ferramenta. E como qualquer ferramenta, é o seu uso que as tornam valiosas ou perigosas. Assim, quero fazer das minhas ferramentas o melhor que posso.